Resumo: | Todos os anos, vastas áreas da região Mediterrânea são devastadas por incêndios florestais. Estes podem causar sérios impactos nos ecossistemas, existindo um interesse crescente sobre os seus efeitos na qualidade da água e no biota aquático. A partir de extratos aquosos de cinzas, que se assumiu simularem escorrências de uma área ardida, determinaram-se analiticamente vários metais e dezasseis hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs). Paralelamente, foi realizada uma avaliação ecotoxicológica desses extratos aquosos de cinzas com quatro espécies standard, representando diferentes grupos funcionais e níveis tróficos. Os extratos aquosos de cinzas induziram uma redução no crescimento dos produtores primários Pseudokirchneriella subcapitata e Lemna minor, e inibiram a luminescência da bactéria Vibrio fischeri, enquanto não se verificou uma imobilização significativa em ensaios com o cladócero zooplanctónico Daphnia magna. Estes resultados são concordantes com a inconsistência que se verifica existir na literatura relativamente aos efeitos deletérios dos incêndios no ecossistema aquático. Esta avaliação ecotoxicológica permitiu construir uma base de análise comparativa com vista a responder à questão essencial que motivou este estudo: a presença do bivalve invasor Corbicula fluminea nos sistemas afetados poderá apoiar a mitigação dos potenciais efeitos dos incêndios florestais nas comunidades aquáticas? Neste contexto, o potencial biofiltrador desta espécie foi testado ao longo de sete dias, utilizando como modelo experimental os extratos aquosos de cinzas simulando escorrências de incêndios. Ao longo da experiência verificou-se a diminuição de metais (redução acima dos 70% para o Mn e Zn) e PAHs (redução de 50% nos valores de naftaleno na água e a bioconcentração de alguns elementos nos tecidos moles (especialmente Cu e Zn) e conchas das amêijoas (especialmente Mn). Paralelamente foi efetuada a avaliação ecotoxicológica dos extratos aquosos após a biofiltração, utilizando a mesma bateria de organismos acima descrita, e de um modo geral, observou-se uma diminuição da toxicidade dos extratos. Aquando da exposição aos extractos aquosos filtrados observou-se uma menor inibição do crescimento dos produtores primários (estatisticamente significativa na taxa de crescimento e no incremento total da biomassa de L. minor) bem como uma menor inibição da luminescência of V. fischeri (ou mesmo estimulação da luminescência em várias das concentrações testadas) e não se registaram efeitos tóxicos em D. magna. Estes resultados sugerem que os efeitos ecológicos nefastos da presença da espécie invasora C. fluminea podem, em cenários particulares, ser compensados em alguma medida por serviços adicionais que a espécie poderá prestar ao ecossistema.
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