Summary: | A preocupação com os níveis de insucesso escolar em matemática, com a falta de interesse e de empenhamento dos alunos na realização de atividades matemáticas, aliada à realidade multicultural atual das escolas portuguesas e que temos vivenciado na nossa prática docente, conduziu-nos ao desenvolvimento de um estudo centrado na problemática da integração de uma perspetiva etnomatemática no processo de ensino-aprendizagem da matemática. Sustentados na revisão de literatura efetuada encaramos a etnomatemática como um recurso didático que pode promover aprendizagens dos conteúdos curriculares, incrementar a motivação para a realização de tarefas matemáticas, desenvolver atitudes positivas em relação à disciplina, favorecendo, em simultâneo, a consciencialização sobre o valor social e cultural da matemática. Neste âmbito, centramos a nossa atenção nos estudos desenvolvidos por Paulus Gerdes sobre diferentes manifestações culturais de povos africanos e, em particular, sobre os desenhos sona praticados pelo povo Cokwe, que ocupa territórios do leste de Angola, sul da República Democrática do Congo e do oeste da Zâmbia. Estes desenhos, além da difícil execução e de uma beleza ímpar, encerram inúmeras ideias matemáticas das quais se destacam, em particular, as relacionadas com as isometrias e simetrias. O estudo, inserido na problemática referida, foi norteado pela seguinte questão de investigação: Em que medida o desenvolvimento de estratégias de ensino e aprendizagem em que se exploram aspetos socioculturais da matemática, com recurso à geometria sona, contribui para a aprendizagem das isometrias, ao nível de conhecimentos, capacidades e ao nível atitudinal e afetivo? Desta questão emergiram três grandes objetivos: i) Conceber, desenvolver e avaliar uma sequência/unidade didática integrando desenhos tradicionais africanos (desenhos sona) para a abordagem das isometrias no 9.º ano de escolaridade; ii) evidenciar o valor da geometria sona para a aprendizagem das isometrias; iii) Analisar se a introdução em sala de aula de contextos socioculturais contribui para motivar os alunos para a realização de atividade matemática e para a valorização do papel da matemática na vida social e cultural. Neste estudo participaram alunos, que frequentam o 3.º ciclo do Ensino Básico de uma Escola Básica 2/3, do concelho de Sintra, tendo a docente - investigadora a dupla função de investigar e de lecionar a disciplina de matemática. Destaca-se o número elevado de alunos com insucesso nesta disciplina, uma percentagem considerável de origem não portuguesa e, de dentro destes, sobressaem os discentes de origem africana ou cujos ascendentes são africanos, tratando-se por isso de uma turma multicultural. Este trabalho seguiu uma metodologia de investigação de natureza qualitativa, com uma vertente de investigação ação, a partir de uma abordagem curricular em geometria do 3.º ciclo. As técnicas de recolha de dados utilizadas foram a inquirição, a observação e a análise documental. Dos instrumentos usados para a recolha de dados destacam-se: questionários aplicados aos alunos, notas de campo, testes de avaliação formativo e sumativo e as produções dos alunos dentro e fora da sala de aula decorrentes das tarefas propostas pela docente. Os dados recolhidos foram analisados através da técnica de análise de conteúdo com base em duas categorias de análise: desempenho matemático e desempenho afetivo e atitudinal. Com vista a tornar mais eficaz a análise e posterior interpretação dos dados, para cada uma das categorias foram definidas duas dimensões de análise. Dos resultados e principais conclusões do estudo destaca-se que a exploração didática dos desenhos sona revelou potencialidades para a apropriação de conhecimentos matemáticos e para o desenvolvimento de atitudes positivas em relação à disciplina. As tarefas propostas aos alunos despertaram interesse, motivando-os para a realização de atividades matemáticas e influenciaram, de forma positiva, a aprendizagem das isometrias e simetria axial e rotacional. Apesar de, ao longo do desenvolvimento da unidade didática, se continuarem a identificar nalguns alunos dificuldades de aprendizagem, foi patente o empenho da turma nas atividades, refletido nos resultados obtidos no teste de avaliação sumativa.
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