Summary: | O fenómeno da globalização, bem como a aposta numa Europa plurilingue e pluricultural coloca novos desafios à educação, mais especificamente, ao trabalho educativo com as línguas na escola (Martins, 2008; Silva, 2009). Pretende-se portanto perceber de que forma uma gestão flexível do currículo, encarado enquanto espaço de construção de significados e de identidades pessoais (Moreira e Silva, 1995), poderá potenciar a interação das diferentes línguas. Sucintamente, procuramos descobrir qual o lugar das línguas no currículo, através de uma abordagem interdisciplinar, sustentada na intercompreensão (Bolívar, 2008; Doyé, 2005). Torna-se assim possível uma didática do plurilinguismo, a qual atende à afetividade inerente aos processos de comunicação intercultural, bem como às representações dos alunos face às línguas (Schmidt, 2011; Andrade, Sá e Moreira, 2007; Castellotti e Moore, 2002). Baseado nesta perspetiva surge o presente trabalho, o qual procura dar respostas às seguintes questões de investigação-ação: Que articulações teóricas podem ser estabelecidas entre intercompreensão, abordagem interdisciplinar do currículo e plurilinguismo como valor?; Que práticas pedagógico-didáticas podemos desenvolver nesse âmbito no 1.º Ciclo do Ensino Básico?; Qual o contributo do projeto de intervenção ao nível das representações/imagens sobre as línguas por parte dos alunos? e Que contributos retiramos desta experiência para a nossa aprendizagem profissional?. À luz destas questões, estabelecemos os seguintes objetivos orientadores: (i) Construir conhecimento teórico-conceptual sobre intercompreensão, abordagem interdisciplinar do currículo e plurilinguismo; (ii) Conceber, desenvolver e avaliar um projeto didático em contexto do 1.º CEB; (iii) Compreender o contributo do projeto ao nível das representações/imagens sobre as línguas por parte dos alunos; (iv) Refletir criticamente sobre o projeto desenvolvido no contexto da nossa Prática Pedagógica Supervisionada e sobre o seu contributo para a nossa aprendizagem profissional. Este trabalho foi realizado no âmbito das unidades curriculares Seminário de Investigação Educacional A1 e A2, que visam promover o desenvolvimento de competências investigativas em educação, nomeadamente de investigaçãoação (Bogdan e Biklen, 1994; Dolbec, 2003) por parte dos futuros professores. Neste sentido, o presente relatório foi desenvolvido numa estreita articulação com as unidades curriculares Prática Pedagógica Supervisionada A1 e A2, sendo que estas possibilitaram o desenvolvimento do projeto de intervenção “As línguas na ponta da língua”.O referido projeto foi implementado numa turma do 4.º ano de escolaridade do 1.º Ciclo do Ensino Básico, com o qual pretendíamos, a partir da abordagem da intercompreensão, explorar os conteúdos programáticos das diferentes áreas do saber através do recurso a diferentes línguas. Seguindo uma metodologia de investigação de natureza qualitativa, socorremo-nos de diferentes dados, obtidos através da gravação áudio e vídeo das sessões do projeto, bem como dos trabalhos realizados pelos alunos, tendo estes sido analisados à luz da metodologia de análise de conteúdo (Bardin, 1997). Genericamente, a partir da análise dos dados recolhidos, no que subjaz às representações dos alunos face às línguas, pode-se afirmar que os alunos: (i) reconhecem a importância das línguas de forma a ser possível a comunicação entre as pessoas; (ii) consideram mais fácil a aprendizagem das línguas que mais gostam, que, por sua vez, são aquelas que consideram mais próximas da sua língua materna, recorrendo, por isso, ao processo de comparação das diferentes línguas para acederem ao sentido das mesmas; (iii) no final do projeto já relativizavam mais a Sua importância e a do Outro, bem como a importância que atribuíam às línguas a uma escala global, evidenciando um leque bastante diversificado de conhecimentos do mundo das línguas e culturas, os quais justificavam em certas alturas com as próprias vivências pessoais. Relativamente à esfera mais afetiva face às línguas, os alunos revelam uma ligação afetiva muito forte com a língua materna (o português, para a maioria dos alunos) e com o inglês, cuja utilização reconhecem à escala global. Por outro lado, línguas como mandarim e russo são aquelas pelas quais os alunos evidenciam menos fascínio, uma vez que estes consideram que estas possuem menos semelhanças interlinguísticas ou sonoras relativamente ao português. Relativamente à opinião dos alunos sobre o projeto, estes referiram-se à metodologia de trabalho com as línguas adotada como sendo inovadora e divertida, ao mesmo tempo que lhes permitia aprenderem novos conteúdos programáticos. Este estudo terá portanto contribuído para o desenvolvimento da capacidade de abertura e disponibilidade das crianças para o contacto com novas línguas e culturas, pondo em evidência os processos que decorrem em situações de intercompreensão. Neste sentido, é possível afirmar que a abordagem da intercompreensão, quando trabalhada transversalmente a todas as áreas do saber, possibilita aos alunos o contacto informal com as línguas. Isto permite o alargamento de horizontes relativamente às mesmas e o reconhecimento de que todos possuímos um repertório linguístico diversificado, o qual deve ser desenvolvido ao longo da nossa vida. Enquanto primeira experiência profissional com o mundo das línguas e das culturas, destaca-se a importância de um projeto como este para a nossa perceção da importância da valorização da opinião e do posicionamento dos alunos face as outras línguas, no sentido de detetar possíveis razões que poderão servir de entrave à abertura ao contacto com a diversidade. É de ressaltar que o empenho e interesse evidenciados pelas crianças nos permitem concluir que as opções didáticas tomadas concorrem para o desenvolvimento da competência plurilingue das crianças, podendo este acontecer de uma forma integrada em qualquer área do saber.
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