Resumo: | O cancro do testículo (CT) é a neoplasia maligna mais frequente em homens em idade reprodutiva e a sua incidência está a aumentar. Os avanços no tratamento desta patologia permitem, actualmente, uma sobrevida média de 95% aos cinco anos. Face ao bom prognóstico da doença, o desafio que se impõe à clínica, no presente, consiste em minimizar os efeitos secundários a longo prazo induzidos pela terapêutica, nomeadamente a esterilidade, dado que os estudos actuais mostram que a possibilidade de paternidade futura é uma das principais preocupações dos doentes que sobrevivem ao CT. No que concerne à fertilidade, os doentes com CT representam um desafio particular uma vez que a sua capacidade reprodutiva não é afectada apenas pelo tratamento (cirurgia, quimio e radioterapia), mas também pelo próprio tumor que se associa à infertilidade, pelo que ambos são incluídos, por alguns autores, na síndrome de disgenesia testicular. A quimioterapia à base de cisplatina induz na maioria dos doentes azoospermia temporária, sendo que a recuperação da espermatogénese tende a ocorrer com o decorrer do tempo. O número de doentes com recuperação da espermatogénese tende a aumentar num período de pelo menos cinco anos. A probabilidade de melhoria da espermatogénese após a quimioterapia, bem como a sua extensão e velocidade, dependem do citostático usado, da dose administrada e da função testicular de base anterior ao tratamento. Contudo, 15% a 30% dos indivíduos vêem a sua função reprodutiva afectada de forma permanente e ainda que o efeito final da quimioterapia seja dependente da dose é actualmente impossível prever quais os doentes que serão afectados definitivamente. Actualmente, o único método capaz de preservar a capacidade reprodutiva dos doentes submetidos a terapêuticas gonadotóxicas é a criopreservação de esperma. Se o doente pretender procriar após ter sobrevivido ao cancro e caso apresente insuficiência gonadal induzida pelos citostáticos, o sémen preservado previamente pode ser usado em técnicas de procriação medicamente assistida (PMA), normalmente a Fecundação in Vitro (FIV) e a Injecção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI), sendo que as taxas de gestações obtidas por cada técnica rondam os 24% e os 33%, respectivamente. O objectivo do presente estudo consiste em verificar o efeito prejudicial da quimioterapia sobre a fertilidade masculina avaliando os parâmetros seminais e as hormonas reprodutivas em doentes com CT antes e após serem submetidos a quimioterapia. Após a colheita de amostras de sémen antes e após a quimioterapia, serão avaliadas a concentração e mobilidade espermáticas de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS), enquanto a morfologia e a integridade da cromatina serão medidas com recurso a um método de coloração do tipo Diff-Quik. A integridade do ácido desoxirribonucleico (ADN) tem sido indicada como sendo um marcador importante da infertilidade masculina e tendo em conta que os parâmetros seminais clássicos não permitem avaliar o estado da cromatina nuclear, torna-se importante determinar o grau de fragmentação do ADN dos espermatozóides e de descondensação da cromatina para uma completa avaliação da qualidade espermática. É de esperar que a maioria dos doentes com CT apresente diminuição da qualidade espermática antes da quimioterapia e que esta agrave com o tratamento. Dois anos após a quimioterapia prevê-se que cerca de metade dos doentes apresente recuperação da espermatogénese. Nos mesmos períodos, serão obtidas amostras de sangue periférico para determinação das hormonas reprodutivas incluindo a hormona luteinizante (LH), a hormona folículo estimulante (FSH), a inibina B, a testosterona total e a testosterona livre. De acordo com a literatura prevê-se que haja diminuição dos níveis séricos de inibina B e de FSH indicando lesão do epitélio germinativo. Embora as células de Leydig sejam mais resistentes aos fármacos citostáticos, os níveis de LH tendem a estar elevados após a quimioterapia, sinal de disfunção endócrina. O aumento dos níveis de LH e de FSH permitem manter os níveis de testosterona nos limites da normalidade. Finalmente, com este projecto pretende-se demonstrar o efeito deletério da quimioterapia sobre a função gonadal de forma a sensibilizar médicos e doentes para a necessidade da criopreservação de esperma antes do início de uma terapêutica gonadotóxica.
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