Os mecanismos de combate à fraude e ao abuso fiscal em IVA

Presentemente, a fraude ao IVA consubstancia uma das maiores preocupações da Comissão Europeia, assim como de cada um dos 28 Estados-Membro da União Europeia (“U.E.”). Esta preocupação resulta da importância significativa que o IVA vai ganhando nas receitas dos Estados-Membro e consequentemente das...

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Detalhes bibliográficos
Autor principal: Fonseca, Cátia Ferreira (author)
Formato: masterThesis
Idioma:por
Publicado em: 2015
Assuntos:
Texto completo:http://hdl.handle.net/10451/16101
País:Portugal
Oai:oai:repositorio.ul.pt:10451/16101
Descrição
Resumo:Presentemente, a fraude ao IVA consubstancia uma das maiores preocupações da Comissão Europeia, assim como de cada um dos 28 Estados-Membro da União Europeia (“U.E.”). Esta preocupação resulta da importância significativa que o IVA vai ganhando nas receitas dos Estados-Membro e consequentemente das receitas da U.E., porquanto o IVA enquanto imposto comunitário contribui para o orçamento próprio da U.E.. Face ao que o IVA representa neste contexto, as autoridades tributárias nacionais dos 28 Estados-Membro têm vindo a ser desafiadas a estar um passo à frente dos infratores, que tentam evitar o pagamento do imposto ou arrecadar um benefício indevido. Porém, as autoridades tributárias têm vindo a ser surpreendidas pelo grau de sofisticação dos esquemas de fraude fiscal, especialmente no que diz respeito à fraude carrossel, típica das operações intracomunitárias. Os motivos para o nível de sofisticação atingido, entendemos nós, está diretamente relacionado com os aumentos de taxas de imposto por um lado, e a diminuição do nível de vida da população causada pela contração da economia desde 2008, por outro. Com efeito, a dificuldade sentida pelos contribuintes em fazer face à carga fiscal que lhes é imposta tem funcionado como incentivo à criatividade dos contribuintes incumpridores. A situação torna-se particularmente grave quando o contribuinte cumpridor percebe que está literalmente a pagar para compensar os incumprimentos dos infratores. Neste cenário, podemos assistir mais uma vez a um incentivo às práticas contrárias à lei. É neste ponto que encontramos maiores entraves à concretização do princípio da justiça fiscal. Esta dificuldade não é exclusiva do IVA mas é comum a todos os impostos, sejam incidentes sobre o consumo ou sobre o rendimento, incidam sobre pessoas singulares ou pessoas coletivas. Contudo, não podemos deixar de salientar que o imposto com maiores fragilidades ao nível do controlo é, em nosso entender, o IVA, precisamente. Essa foi também uma das motivações para a escolha do tema aqui desenvolvido. Como teremos oportunidade de verificar ao longo da dissertação, as fragilidades apontadas ao IVA resultam, não raras vezes, da cumplicidade dos próprios consumidores finais sobre quem recai o imposto, no fim da cadeia. Sem se darem conta, acabam muitas vezes por pagar IVA nos bens e serviços adquiridos, permitindo aos sujeitos passivos responsáveis pela entrega do IVA ao Estado, arrecadar o valor correspondente para seu benefício próprio, em violação absoluta dos princípios que subjazem ao sistema do IVA, de entre os quais destacamos o princípio da neutralidade. São precisamente os consumidores finais que contribuem para a ocultação de operações relevantes para efeitos de IVA, lesando o Estado e no limite, lesando-se a si mesmos. É quase irónico se pensarmos nessa perspetiva mas é essa a realidade observada. Foi essa mesma realidade que resultado, e tem resultado com bastante frequência nos últimos tempos, na adoção de cada vez mais medidas de controlo à fraude e ao abuso fiscal. No entanto, a adoção dessas medidas não tem sido pacificamente recebida por parte dos contribuintes que se recusam a ser “polícias” do Estado. Entendem os contribuintes que as funções de inspeção e controlo não são da sua competência, o que reconhecemos. Porém, face à diminuição de receita fiscal em resultado de práticas abusivas e fraudulentas, poucas alternativas restam: ou se aumenta a carga fiscal ou se melhoram os mecanismos de controlo. Enquanto mal necessário, cremos que a segunda opção é a menos lesiva para o contribuinte, que tem o dever cívico de colaborar. Tomando como certo que este é um problema sem fim à vista, propomo-nos a analisar os métodos que têm vindo a ser adotados com vista a combater a fraude e ao abuso, propondo soluções que consideramos adequadas à resolução deste flagelo. Quando olhamos para as soluções possíveis, somos obrigados a observar não só a realidade nacional mas também o contexto europeu em que nos inserimos. Não podemos ignorar a génese comunitária do imposto, nomeadamente a Diretiva IVA enquanto orientadora das legislações nacionais em tudo o que se refira ao IVA. É por este motivo que a articulação entre os vários Estados-Membro, nomeadamente das suas autoridades tributárias nacionais, adquire neste momento, em nosso entender, uma importância crescente. Neste contexto, diversas medidas adotadas no combate à fraude no IVA apontam precisamente nesse sentido: o sentido de harmonização e de cooperação. Afinal, num mercado cada vez mais comunitário e menos doméstico, a união fiscal afigura-se cada vez mais adequada à realidade atual. A este respeito, entendemos que o IVA é o melhor exemplo da ainda tímida união fiscal, apesar de todas as insuficiências detetadas. As referidas insuficiências resultam, em nossa opinião, da dificuldade de harmonizar a legislação e regulamentação em matérias tão sensíveis como as de natureza fiscal, nomeadamente devido às realidades tão díspares observadas em cada Estado-Membro, que adquirem maior relevância quando se definem políticas fiscais. Se em matéria de IVA, essas divergências podem ser mais facilmente colmatadas, o mesmo não se poderá dizer relativamente aos impostos sobre o rendimento. O IVA pago por cada pessoa numa base mensal ou anual é variável de acordo com as suas opções de consumo, o que já não se verifica nos restantes impostos. Se as matérias de natureza fiscal, em geral, são delicadas, as de natureza fiscal no âmbito dos impostos sobre o rendimento, revestem-se de particular sensibilidade. É, portanto, mais fácil iniciar um processo de união fiscal usando como cobaia o imposto sobre o consumo, um imposto caracterizado pelo efeito anestésico que comporta. Esta e outras características do imposto serão desenvolvidas ao longo da dissertação. Uma vez justificada a necessidade de adotar medidas mais exigentes do ponto de vista do controlo, cumpre salientar que as nossas propostas de atuação vão no sentido de garantir a harmonização das regras aplicáveis e a cooperação entre as várias autoridades tributárias dos vários Estados-Membro, mas não só. Não obstante esse objetivos mais gerais, as nossas propostas vão mais além na sua concretização: à semelhança do que se passa, por exemplo ao nível da União Bancária, em que o Banco Central Europeu assume as funções de supervisão, até agora exclusivamente confiadas às autoridades de supervisão nacionais. A ideia da criação de uma autoridade tributária comum a todos os Estados-Membro, na qual interagissem equipas de inspeção pertencentes às diferentes autoridades nacionais seria um passo em frente nos objetivos principais de harmonização e cooperação, tanto ao nível substantivo como ao nível dos procedimentos adotados. Os custos inerentes à criação desta entidade seriam suportados pelo orçamento próprio da U.E. para o qual os vários Estados contribuem com parte da sua receita proveniente do IVA. Também a possibilidade de aplicar uma taxa de IVA única em toda a U.E. nos surge como hipótese atendível capaz de assegurar maior segurança jurídica e de simplificar a atuação da proposta autoridade tributária europeia. O mesmo se diga relativamente à declaração periódica normalizada e à fatura única que já fazem parte integrante do horizonte comunitário. Estas e outras medidas são desenvolvidas a longo do trabalho: umas já aplicadas atualmente, outras recentemente adotadas, ainda outras com data de entrada em vigor já prevista e, por último, algumas que não passam de ideais ainda longe de poderem ser concretizados. De entre todas as medidas apresentadas destacamos aquela que menos depende de imposições legais, fazendo a sua aplicação parte da autonomia privada de cada um de nós bem como do cumprimento de um dever de cidadania que assume cada vez mais importância: cada contribuinte tem de apreender a ideia de que a exigência de fatura nos bens e serviços adquiridos é um dever de cidadania capaz de resolver muitos problemas que estão na origem da tão contestada subida das taxas de imposto em vigor, seja ao nível do rendimento como ao nível do consumo.