Resumo: | Este artigo visa reflectir sobre a governabilidade da diferença nas sociedades actuais, partindo da consideração de duas premissas: a) as nações são construções legais e simbólicas, ou seja, o seu espaço de pertença é definido por uma dimensão normativa (cívica) e uma dimensão cultural (identitária); b) a cidadania é, mais do que um estatuto, uma prática que se articula estreitamente com a dinâmica das esferas institucionais democráticas. Desta constatação extraímos a ideia de dualidade do Estado-nação e postulámos que a cidadania, enquanto estatuto que estabelece um elo entre o indivíduo e um dado Estado, encontra-se permanentemente em tensão, pela indefinição própria entre uma primordialidade identitária e uma solidariedade universalista expressa naquilo que Schnapper designou “sociedade dos cidadãos”. Advogamos que o potencial inclusivo da cidadania deve ser perspectivado em termos da construção permanente desse mesmo potencial e não como uma propriedade inerente às instituições democráticas. Neste sentido, inclinamo-nos para uma concepção de democracia enquanto arena de iterações democráticas em detrimento de uma concepção mais normativa e procedimental. A governabilidade da diferença é o espaço dessa permanente negociação entre as instituições de uma determinada arena política, as comunidades suas interlocutoras, e os processos de deliberação e troca que se estabelecem entre os actores e as suas reivindicações apresentadas na esfera pública. A este espaço dinâmico e mutável damos o nome de multiculturalismo. Por conseguinte, defendemos que a governabilidade da diferença deve ser entendida por relação com uma concepção dinâmica da democracia, que não se restrinja a postular, por um lado, o universal como horizonte e, por outro, a incompatibilidade entre esferas distintas e essencializadas num contexto de heterogeneidade cultural.
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