Resumo: | Pretende, aqui, refletir-se sobre o papel da personagem num dos grandes géneros do jornalismo: a reportagem. Partindo de um quadro epistemológico delimitado pelos media studies e pelos estudos narrativos, ensaia-se uma abordagem ao estatuto paraficcional desta categoria narrativa em textos jornalísticos, tentando perceber de que forma a sua construção permite, por um lado, humanizar a história e, por outro, convidar o leitor a imergir no acontecimento. Minutos após os atentados de Paris, no passado mês de novembro, as redes sociais começaram a ser invadidas por um caudal de informação, a que os media de informação rapidamente se ligaram, começando a acompanhar a evolução dos factos, aproveitando muito do que no Facebook e no Twitter se ia publicando. Depois de alguns dias de distanciamento, percebe-se que o jornalista profissional tem um papel determinante na construção social do acontecimento, não só conferindo-lhe alguma espessura narrativa, mas sobretudo no modo como modela e constrói a sua memória futura. Nesse sentido, além de ‘curador do real’, o jornalista assume hoje, mais do que nunca, uma função crucial que passa já não pelo monopólio da informação, mas pela sua organização, triagem e significação. Propõe-se uma análise narrativa de três reportagens de três órgãos de comunicação generalistas portugueses – a Revista E (Expresso), o Público e o Observador – que permitirá constatar que, no rescaldo dos atentados, a notícia ‘ao minuto’ é progressivamente substituída por um investimento narrativo. Esse investimento traduz-se, sobretudo, na aposta numa das categorias centrais da narrativa: a construção de personagens, contributo essencial para a construção de histórias de interesse humano. As questões que norteiam este estudo são essencialmente estas: i) como são figuradas estas personagens? ii) será que esta estratégia de humanização não contribuirá para matizar as dimensões política, económica, social e cultural do acontecimento? iii) qual a memória futura que estas histórias constroem?
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