Videoclipe(s) como recurso didático: ver, ler e ouvir a (des)igualdade de género nos media

Os media tornaram-se uma poderosa ferramenta na formulação de opiniões, saberes, normas, valores e subjetividades, que, de alguma forma, influenciam a visão da realidade. Por mais que se proclame a objetividade na comunicação, as mensagens por eles veiculadas não são neutras, desenvolvem regimes de...

Full description

Bibliographic Details
Main Author: Sousa, Arminda Maria Malho Santos (author)
Format: doctoralThesis
Language:por
Published: 2020
Subjects:
Online Access:http://hdl.handle.net/10773/27697
Country:Portugal
Oai:oai:ria.ua.pt:10773/27697
Description
Summary:Os media tornaram-se uma poderosa ferramenta na formulação de opiniões, saberes, normas, valores e subjetividades, que, de alguma forma, influenciam a visão da realidade. Por mais que se proclame a objetividade na comunicação, as mensagens por eles veiculadas não são neutras, desenvolvem regimes de autenticidade e disputam sentidos múltiplos sobre a sexualidade e o género. O diálogo entre comunicação e género implica não só reforçar o olhar crítico em relação aos modos hegemónicos veiculados pelos meios de comunicação, mas também adequar o olhar sobre as práticas nos espaços de educação e formação. Importa conhecer, entre todas as ferramentas atualmente disponíveis, quais as que os/as alunos/as utilizam e quais têm potencial para uso em sala de aula. Aqui se inscrevem, em particular, os videoclipes, cujos componentes visuais e verbais podem inspirar e motivar os/as alunos/as, promover uma aprendizagem mais profunda, estimular o fluxo de ideias e proporcionar uma oportunidade para a liberdade de expressão, entre outros. No estudo que se apresenta, que contou com a colaboração de 65 adolescentes e jovens, alunas/os de 7º e 12º ano de escolaridade, teve-se em conta uma primeira questão de investigação: “Na abordagem didática de videoclipes mais visionados por adolescentes e jovens que imagens de sexualidade e género lhes é permitido recolher?” Identificadas imagens de sexualidade e género, importava apreender “Que papéis e estereótipos de género são enfatizados nos videoclipes mais visionados pelos/as jovens?” e por fim “Como se expressam as diferenças e a (des)igualdade de género?” Numa fase exploratória do estudo, a investigadora elaborou um inquérito por questionário como instrumento de recolha de informação que permitisse, entre outros aspetos, definir pistas de abordagem do objeto de estudo e fazer o levantamento dos videoclipes mais visionados pelos/as jovens. Da aplicação do questionário resultou a seleção de quatro videoclipes (As Long As You Love Me ft. Big Sean”, “Try”, “Havemos de lá chegar” e “Scratch My Back”), cujo conteúdo foi objeto de análise. Para cada um deles, a investigadora elaborou um relatório do qual constavam informações como formato, gravação, género musical, duração, sinopse, estrutura do videoclipe, relação música-imagem-linguagem (letra) e levantamento de possíveis contributos para a desigualdade de género (estereótipos relativos aos traços ou atributos de personalidade, aos papéis desempenhados e/ou às características físicas). Para registar as opiniões da investigadora e dos/as jovens participantes, relativamente ao discurso veiculado pelos videoclipes, foram elaborados quatro guiões de visualização/análise. Cada guião apresenta um conjunto de atividades, divididas em quatro grandes blocos: “aprender a olhar”, “compreender e analisar”, “interpretar e avaliar” e “transformar” (Díez Gutiérrez, 2004b). Embora nos videoclipes as narrativas sejam representações construídas por alguém e não correspondam à realidade (Pacheco, 2017), a leitura crítica do seu discurso permitiu a cada um/a dos/as intervenientes dar um sentido ao que viu (imagem), leu (letra) e ouviu (música). Quanto aos eixos temáticos identificados pelos/as participantes, conclui-se centrarem-se na afetividade (paternal, parental, erótica e sexual, amizade) e no amor, nas relações interpessoais que se estabelecem em meio laboral e na violência nas relações afetivas e/ou amorosas. Constatou-se, ainda, que nos discursos analisados, persistem conceções estereotipadas sobre o feminino/ feminidade/ ser mulher e masculino/masculinidade/ ser homem. Assim, cabe às mulheres serem jovens, magras, bonitas, sensuais, para cumprirem os requisitos de beleza e atração física contemporâneos (Mota-Ribeiro, 2002a, 2002b; Castro, 2003; Campos, Cecílio & Penaforte, 2016; Teixeira & Marques, 2016) e usar saias e vestidos, roupas justas e íntimas, como códigos de sedução (Teixeira & Marques, 2016). Os homens devem ser altos, magros, jovens e musculados. Pois, corpo musculado, para além de indicativo de masculinidade é sinónimo de força e virilidade (Januário, 2013); jovem como “signo de narcisismo e sedução” (Santos, 2017, p.140); alto e magro, porque, “a uma silhueta esguia “é associado reconhecimento, estatuto, sucesso pessoal, profissional e social” (Santos, 2017, p.141). Se pretendem aparentar poder, devem usar fato ou camisa de mangas compridas, pois, a indumentária deve ser “condizente com o fazer-saber dos negócios” (Natt & Carrieri, 2016, p.120). Conclui-se, ainda, que o discurso veiculado remete às diferenças psicológicas e características da personalidade, aos atributos morais de comportamento e às competências pessoais, situa a mulher numa situação de dependência e inferioridade, perpetua os papéis tradicionalmente atribuídos a homens e a mulheres e desiguais relações de poder e promove a heteronormatividade. Este estudo ajuda a corroborar a ideia de que é necessário trabalhar as questões de sexualidade e género veiculadas nos discursos dos videoclipes, para que este não seja recebido de forma passiva, até porque o discurso está pejado de subjetividade. Por outro lado, confirma-se que a integração dos videoclipes no contexto da operacionalização da educação sexual em meio escolar é exequível e passível de envolver os diferentes intervenientes no processo de ensino e de aprendizagem, e na consciencialização dos e das jovens para a existência de estereótipos e estigmas sociais que contribuem para acentuar desigualdades entre mulheres e homens