Resumo: | É nossa convicção que, enquanto não for alcançado um critério unitário do que é hoje considerado, em Direito Processual Penal, por ―indícios suficientes” , o risco de condenação de inocentes será necessariamente elevado ou, pelo menos, superior a uma fasquia cujo patamar se pretende o mais baixo possível. Risco esse que será necessariamente acrescido se a convicção do decisor emergir da factualidade descrita no despacho de pronúncia e de acusação. Na verdade, a certeza e o rigor duma decisão penal devem obrigar a uma maior acuidade. Nestas circunstâncias, revela-se de extrema importância impor cautelas acrescidas na valoração da prova, lançando-se mão de todas as formas possíveis em ordem ao apuramento dos factos e à credível diluição de todas as dúvidas suscitadas. Só assim podemos almejar um processo leal e justo, tanto para as vítimas como para os arguidos, simultaneamente credível para todos os demais destinatários da decisão, vulgo sociedade civil, que espera da máquina judicial um instrumento capaz de apurar a realidade histórica e sobre ela decidir de acordo com a lei, a justiça e a equidade. O conceito de ―indícios suficientes” representa uma peça chave no Direito Processual Penal, ao fornecer a base a partir do qual se justifica a passagem para a fase principal do processo penal – o julgamento –, revelando-se um dos pressuposto essenciais para a dedução da acusação e prolação do despacho de pronúncia. Saber quando devem os indícios ser considerados suficientes é questão que tem dividido a doutrina e a jurisprudência e, por isso justifica-se que nos detenhamos sobre este ponto. Uma vez que, em processo penal, o objectivo último será o da prossecução daverdade material, que não a verdade ontológica atendendo ao limite inultrapassável em toda e qualquer investigação que é o respeito pela dignidade da pessoa humana, do qual resulta que a verdade não pode ser atingida a qualquer custo, procurámos demonstrar, ao longo da presente tese, que o critério norteador da problemática da suficiência dos indícios deve obedecer à ideia de que, em face de um juízo de prognose antecipada, se puder afirmarque, com os elementos de prova existentes no inquérito ou na instrução, a repetirem-se em julgamento, e não sendo abalados ou infirmados por outros aí produzidos, o arguido será seguramente condenado. Razão pela qual, deve defender-se para a acusação, como para a pronúncia, a mesma exigência de prova e de convicção probatória, a mesma exigência de verdade requerida pelo julgamento final. Ou seja, a apreciação dos indícios tem de ser feita de acordo com os princípios normativos da prova, designadamente, só podem ser apreciadas as provas que não forem proibidas por lei. E terão de ser apreciadas de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, ressalvados os juízos técnico-científicos, devendo o princípio in dubio pro reo estar sempre presente no que toca à apreciação da prova. Funcionando o conceito de ―indícios suficientes” como critério de decisão e de justificação da acusação, a presente investigação revela a tentativa de alcançar uma concretização da expressão “possibilidade razoável de condenação” prevista no n.º 2 do art.º 283.º do Código de Processo Penal, procurando a solução que melhor se harmoniza com a estrutura do Processo Penal Português e as exigências da presunção de inocência do arguido e de verdade material, do princípio da dignidade da pessoa humana e da presunção de inocência. Razão pela qual fomos levados a concluir que, a aferição do grau de possibilidade a que alude o n.º 2 do art.º 283º, do Código de Processo Penal passa, necessariamente, pela ideia de ―possibilidade particularmente qualificada” ou de ― probabilidade elevada” o que significa exigir, na suficiência dos indícios, a mesmaexigência de verdade requerida para o julgamento final, mas apreciada em face dos elementos probatórios e de convicção constantes do inquérito (e da instrução) que, pela sua natureza, poderão eventualmente permitir um juízo de convicção que não venha a ser confirmado em julgamento. A presente tese encontra-se estruturada em quatro partes essenciais: Uma primeira, com uma breve introdução histórica, espelhando a ancestral preocupação das sociedades na matéria objecto da presente dissertação. Uma segunda parte (de investigação), que corporiza uma fundamentação teórica alargada, espelhando diversas normas positivadas, conceitos, teorias, publicações, doutrina e jurisprudência, e ainda o modo como os Tribunais, perante os parâmetros enunciados, desenvolvem a actividade de apreciação e valoração do conceito de ―suficiência de indícios” em ordem à descoberta da verdade material, decompondo e explicitando o que são indícios, qual a medida da sua suficiência e para que efeitos os indícios necessitam revelar-se como suficientes. A terceira parte é composta pela nossa contribuição no tema, através da exposição e desenvolvimento da posição por nós adoptada, visando alcançar um critério único de ―indícios suficientes. A terminar a presente dissertação, são apresentadas as conclusões da investigação desenvolvida.
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