Resumo: | Este estudo pretende investigar as razões profundas para uma mutação essencial no modelo de santidade em Portugal durante o século XVII. Essa mutação, que é bastante nítida nos processos inquisitoriais de falsa santidade, teve lugar em meados do século e consistiu numa interiorização da vivência mística, em detrimento de manifestações exteriores. O corpo inanimado do alegado santo impõe se a partir daí como signo e única forma de manifestação externa, substituindo se parcialmente às visões, locuções e outros favores divinos. Esta “somatização” da mística resultou em grande medida do processo de interiorização trazido pela chamada “modernidade”, na qual têm destaque a autobiografia, a confissão e a direção espiritual. Ao mesmo tempo, o final do século XVII trouxe o fenómeno da marginalização da mística, levando a que este género de manifestações se confinasse às camadas populares, principalmente camponesas, transmitindo uma falsa ideia de arcaísmo a um fenómeno que era, na sua essência, um produto historicamente recente.
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