Resumo: | O envelhecimento é um processo complexo e multifatorial, cujos mecanismos moleculares permanecem ainda desconhecidos. O cérebro é o órgão mais afetado pelo processo de envelhecimento, estando as doenças neurodegenerativas diretamente relacionadas com o aumento da idade. O aumento da esperança média de vida, e o consequente aumento da prevalência de declíneo cognitivo, impulsionou a investigação na área do envelhecimento, a fim de desenvolver estratégias que contribuam para o aumento da esperança de vida com qualidade. A restrição calórica é uma das estratégias não farmacológicas que promove o aumento da esperança de vida em diferentes organismos. A autofagia, um processo intracelular altamente regulado, envolvido na reciclagem de constituintes celulares e na manutenção da homeostase celular, está envolvida nos mecanismos anti-envelhecimento da restrição calórica. Além disso, os efeitos anti-envelhecimento induzidos pela restrição calórica foram relacionados com alterações no sistema neuroendócrino, nomeadamente o aumento do neuropeptídeo Y (NPY) no núcleo arqueado do hipotálamo. O NPY é um dos peptídeos mais abundantes no sistema nervoso central, tendo um efeito neuroprotector em diversas áreas cerebrais. Estudos sugerem que o NPY pode ser um mediador dos efeitos anti-envelhecimento promovidos pela restrição calórica; no nosso grupo demonstrámos que o NPY não só induz autofagia em neurónios hipotalâmicos, como também medeia a autofagia induzida pela privação de nutrientes, sugerindo que este neuropeptídeo possa estar envolvido nos efeitos benéficos induzidos pela restrição calórica. No entanto, o efeito do NPY na autofagia em outras regiões cerebrais, nomeadamente no córtex, bem como o seu potencial papel no aumento da esperança de vida, é desconhecido. Um outro efeito neuroendócrino promovido pela restrição calórica é o aumento dos níveis de grelina, um peptídeo orexigénico secretado pelo estômago. A grelina, de forma similar ao NPY, mimetiza muitos dos efeitos induzidos pela restrição calórica, atuando possivelmente como um importante mediador metabólico nos seus efeitos anti-envelhecimento. Contudo, o efeito da grelina na autofagia induzida pela restrição calórica ainda não foi investigado. Neste estudo avaliou-se o efeito da privação de nutrientes na autofagia em neurónios corticais de rato bem como o possível envolvimento do NPY e seus recetores neste processo. Neste trabalho também se estudou o efeito do NPY per se na regulação da autofagia e as vias de sinalização envolvidas. O potencial envolvimento da grelina e do seu recetor na autofagia induzida por restrição calórica, tal como, o efeito da grelina na modulação da autofagia em neurónios corticais também foi avaliado. 12 Este estudo mostrou que a privação de nutrientes induz autofagia em neurónios corticais, de uma forma dependente do tempo de exposição. A indução da autofagia foi mediada pelos recetores Y1, Y2 e Y5 do NPY, envolvendo diferentes vias de sinalização. Paralelamente à promoção da autofagia, a privação de nutrientes induziu um aumento dos níveis de NPY em neurónios corticais, reforçando o envolvimento do NPY na autofagia mediada por privação de nutrientes. Posteriormente, avaliou-se o efeito do NPY per se na regulação da autofagia em neurónios corticais. À semelhança da privação de nutrientes, o NPY também aumentou o fluxo autofágico, de uma forma dependente do tempo de exposição, sendo este efeito mediado pela activação dos recetores Y1, Y2 e Y5 do NPY. Para além do NPY, a restrição calórica também aumenta os níveis de grelina. Deste modo, estudou-se o envolvimento deste peptídeo na indução da autofagia mediada por privação de nutrientes. A grelina não só induziu a autofagia em neurónios corticais, como também contribuiu para o aumento do fluxo autofágico induzido pela privação de nutrientes. Este estudo mostrou, pela primeira vez, que o NPY e a grelina, considerados miméticos da restrição calórica, promovem a autofagia em neurónios corticais. Adicionalmente, em resposta a uma baixa disponibilidade de nutrientes, estes neurónios expressam NPY e grelina. Tendo em conta que os processos autofágicos estão comprometidos no envelhecimento e nas doenças neurodegenerativas associadas à idade, o efeito sinergístico do NPY e da grelina na regulação da autofagia pode ser considerado um ponto de partida para o desenvolvimento de novas estratégias para retardar o envelhecimento e aumentar a longevidade aliada a uma melhor qualidade de vida.
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