Resumo: | Pretendemos com este estudo compreender se as vítimas de violência doméstica que apresentam queixa e as que não apresentam se distinguem entre si em relação a aspetos de natureza sociodemográfica (idades, estado civil, situação profissional, idades dos agressores, etc.), em relação ao tipo de violência e consequências, em relação a traços de ansiedade e ansiedade estado, bem como em relação a perturbações psicopatológicas. Recorremos a uma amostra de 63 mulheres vítimas de violência doméstica com processos no Núcleo de Atendimento à Vítima de Violência Doméstica, da Cáritas Diocesana de Aveiro. Tinham idades entre 25 e 60 anos, com uma média de 44,1 anos. Para o estudo utilizámos uma ficha para recolha de dados sociodemográficos, o STAI-Y1 e o STAI-Y2 para autoavaliação da ansiedade (traço e estado), bem como o MINI (Mini International Neuropsychiatric Interview), para despistar perturbações psiquiátricas, risco de suicídio e perturbações de personalidade. Os dados foram analisados com o programa SPSS 17.0. Conseguimos perceber que relativamente a dados sociodemográficos e à ansiedade traço e estado, as vítimas que apresentaram queixa não se distinguem das que não apresentaram. Constatámos que, na generalidade dos resultados encontrados relativamente à caracterização sociodemográfica dos agressores e vítimas, os nossos dados são semelhantes aos das estatísticas da APAV. Relativamente ao teste das nossas hipóteses, nomeadamente às variáveis clínicas avaliadas pela entrevista estruturada com o guião do MINI, perturbação obsessivo-compulsiva, anorexia e bulimia, dependência e abuso de álcool e substâncias, não estão de acordo com os resultados encontrados na literatura. Os nossos resultados relativamente à perturbação de pânico, risco de suicídio, stresse pós-traumático, depressão major, distimia e a ansiedade generalizada vão de encontro aos relatados na literatura. Relativamente ao facto de todas as vítimas da nossa amostra com perturbação psicótica atual e com perturbação do humor com sintomas psicóticos terem apresentado queixa, alerta-nos para um problema sério. Efetivamente, os doentes psicóticos, pela sua atividade delirante podem apresentar queixas não fundamentadas. Por outro lado, podem, numa percentagem significativa, agredir, provocando um ciclo interpessoal de agressões mútuas. Comparando as participantes em função de terem ou não apresentado queixa, na nossa amostra, das 35 vítimas com perturbação de ansiedade generalizada, 2/3 apresentaram queixa, e quanto ao suicídio, todas as vítimas com risco elevado de suicídio apresentaram queixa, e apenas cerca de 1/3 das vítimas com risco ligeiro apresentou queixa. Como limitação a este estudo, temos o facto de as vítimas que participaram se terem voluntariado para tal. Isto é, sendo uma amostra intencional, não houve amostragem aleatória, pelo que estes nossos dados não são generalizáveis à população geral. A segunda limitação é relativa à distância temporal entre as agressões e a recolha de dados. Como foi utilizada toda a base de dados do Núcleo, foram contactadas vítimas com processo há três anos, que já passaram por separações e por terapias e tratamentos psiquiátricos, o que pode enviesar alguns dados.
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