Summary: | Introdução: A Osteogénese Imperfeita (OI) é uma patologia rara do tecido conjuntivo associada em 90% dos casos a mutações dos genes que codificam o colagénio tipo 1. As manifestações oculares desta patologia são importantes para o diagnóstico e classificação, sendo a mais frequente a coloração azulada da esclerótica. Outras alterações oculares associadas incluem a reduzida espessura central da córnea, opacidades corneanas, diâmetro reduzido da córnea, agenésia congénita da membrana de Bowman, queratocone, miopia, glaucoma e reduzida rigidez ocular. Objectivos: Apresentação do caso de uma criança de 3 anos com o diagnóstico de osteogénese imperfeita tipo I, que desenvolveu hidrópsia da córnea esquerda associada a reduzida espessura e ectasia corneana. Descreve-se a evolução clínica perante a terapêutica efectuada, sendo que, de acordo com a pesquisa bibliográfica efectuada, não existem descrições anteriores de alterações corneanas semelhantes em crianças, no contexto desta doença rara. Material/Métodos: Criança do sexo masculino, raça negra, com o diagnóstico de Osteogénese Imperfeita tipo I confirmado por estudo molecular, que identificou a mutação c.697-2AG no gene COL1A1. Não existia história familiar conhecida desta patologia. À data da primeira observação oftalmológica, aos 2 anos e meio de idade, apresentava escleróticas azul-acinzentadas, esclerocórnea bilateral e opacidades para-centrais corneanas. A refracção, sob atropina, era de +3,00+1,50 (60) no olho direito, e -2,00-9,00(110) no olho esquerdo. O fundo ocular revelou discos ópticos normais, sem outras alterações. O tónus ocular era normal à palpação. Não foi possível aferir a acuidade visual por falta de colaboração da criança, no entanto, foi prescrita correcção com óculos, que o doente não tolerou. Do exame objectivo geral salienta-se macrocrania, membros curtos e curvados e tórax estreito. O doente foi observado com intervalos de 3 meses, sem alterações a salientar. Nove meses após a avaliação inicial, a biomicroscopia mostrou a presença de ectasia corneana central bilateral com pequenos leucomas dispersos na média periferia de ambas as córneas. A. No entanto, não foi possível a realização de topografia corneana por falta de colaboração do doente. A determinação da espessura central da córnea, por paquimetria ultrassónica, revelou 327 m no olho esquerdo e 328 m no olho direito. Na consulta subsequente, o doente apresentou edema da córnea esquerda, com opacidades extensas para-centrais inferiores, sem hiperémia conjuntival, lacrimejo ou fotofobia objectivável. O olho direito não revelou alterações. A avaliação da dor ou diminuição da acuidade visual não foi possível. Foi então diagnosticada hidrópsia corneana aguda do olho esquerdo. Prescreveu-se medicação tópica anti-edematosa (cloreto de sódio 50 mg/g em pomada oftálmica, Oftalmolosa Cusi Antiedema), antibiótica (gentamicina) e anti-hipertensora (timolol e dorzolamida), com aplicações repetidas de 12 em 12 horas, e oclusão do olho esquerdo. Manteve-se a terapêutica descrita durante um mês, com re-observações frequentes. Resultados: Assistiu-se à redução da extensão do edema da córnea e aumento da transparência corneana do olho esquerdo, apesar da manutenção das lesões. No mês seguinte a córnea esquerda mostrou resolução do edema com a presença de lesões cicatriciais. Foram registadas imagens por lâmpada de fenda com máquina fotográfica desde o início do acompanhamento, de forma a documentar a evolução da patologia. Conclusões: A osteogénese imperfeita é uma patologia rara do tecido conjuntivo que pode originar alterações ao nível das várias estruturas oculares. A ectasia da córnea, associada a reduzida espessura deste tecido, pode levar à ruptura da membrana Descemet e infiltração do estroma por fluido. Para além da raridade da patologia subjacente, após pesquisa bibliográfica extensa, não foi encontrado nenhum caso descrito de ectasia da córnea em criança com osteogénese imperfeita. Neste doente, a espessura fina de ambas as córneas, associada a alteração do colagénio tipo I subjacente, e a presença de cicatrizes dispersas na córnea do olho esquerdo, indicam um prognóstico reservado, apesar da difícil aferição da acuidade visual e caracterização da topografia corneana. O acompanhamento oftalmológico é, assim, fundamental, podendo vir a considerar-se o cross-link de colagénio com riboflavina e irradiação ultra-violeta ou transplante de córnea no futuro, se assim for indicado. Bibliografia: 1. Shah SG, Sridhar MS, Sngwan VS. Acute corneal hydrops treated by intracameral injection of perfluoropropane (C3F8) gas. 2005; 139(2):368-70 2. Brixen KT., Illum NO., Hansen B., Lund AM., Mosekilde L. Osteogenesis imperfecta – genetics, diagnosis and medical treatment. 2007; 169(1):30-4 3. Tanabe T., Mimura Y., Amano S., Oshika T. Intracameral air injection for acute hydrops in keratoconus. Am J Ophthalmol 2002; 133(6): 750-2 4. Dijk F., Cobben J., Kariminejad A., Maugeri A., Nikkels P., Rijn R., Pals G. Osteogenesis Imperfecta: a review with clinical examples. Mol Syndromol 2011; 2:1-20 5. Martin E., Shapiro J. Osteogenesis Imperfecta: epidemiology and pathophisiology. Curr Osteoporos Rep. 2007; 5(3):91-97
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