Caracterização epidemiológica da criptosporidiose em Portugal, por estudo molecular de isolados de Cryptosporidium spp. de humanos e de animais

Cryptosporidium spp. é um protozoário ubíquo causador de patologia gastrintestinal em humanos e animais. A infecção ocorre por ingestão de oocistos, após contacto directo com pessoas – transmissão antroponótica – ou outros animais infectados – transmissão zoonótica – podendo, ainda, ocorrer, indirec...

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Detalhes bibliográficos
Autor principal: ALVES, Maria Margarida Ferreira (author)
Formato: doctoralThesis
Idioma:por
Publicado em: 2019
Assuntos:
Texto completo:http://hdl.handle.net/10362/56825
País:Portugal
Oai:oai:run.unl.pt:10362/56825
Descrição
Resumo:Cryptosporidium spp. é um protozoário ubíquo causador de patologia gastrintestinal em humanos e animais. A infecção ocorre por ingestão de oocistos, após contacto directo com pessoas – transmissão antroponótica – ou outros animais infectados – transmissão zoonótica – podendo, ainda, ocorrer, indirectamente, através da água ou de alimentos contaminados. A importância relativa dos diferentes modos de transmissão, não se encontra, ainda, esclarecida. A criptosporidiose humana está associada, sobretudo, à infecção por C. hominis e por C. parvum, embora se encontrem descritos, também, casos de infecção por C. felis, C. meleagridis, C. muris, C. canis, C. suis e Cryptosporidium genótipo cervo. Com o presente trabalho pretendeu-se determinar as espécies e genótipos de Cryptosporidium que, em Portugal, se encontram associadas, quer à infecção humana, quer à infecção em gado doméstico, animais de companhia e animais silváticos, a fim de identificar, não só os parasitas infectantes para o Homem, como, também, os seus possíveis reservatórios zoonóticos. Para além disso, foi, ainda, objectivo deste trabalho, contribuir para a compreensão do papel desempenhado pelas vias de transmissão zoonótica e antroponótica na epidemiologia da criptosporidiose humana no nosso País. Na população de infectados por VIH, com sintomatologia gastrintestinal, que estudámos, entre Junho de 2001 e Janeiro de 2005, foi encontrada a percentagem de infecção por Cryptosporidium spp. de 8,3% (18/217). Nos animais de companhia, a taxa de infecção obtida para gatos com dono e para cães com e sem dono foi de, respectivamente, 1,8% (2/109) e 0% (0/157). Nos animais silváticos de vida livre estudados, carnívoros e pequenos mamíferos, não foi encontrada infecção por Cryptosporidium spp.. Nos animais do Jardim Zoológico de Lisboa, apenas foram encontrados oocistos em duas amostras fecais de mamíferos, uma de um bisonte americano e, outra, de um gnu de cauda branca, correspondendo a uma percentagem de amostras positivas de 0,9% (2/217); também foram observados oocistos numa amostra fecal de uma tartaruga estrela indiana que havia chegado recentemente ao Jardim Zoológico. A caracterização molecular de isolados humanos de Cryptosporidium spp., detectados entre 1994 e 2005, permitiu identificar, ao nível da espécie, 51 parasitas: 52,9% (27/51) pertenciam à espécie C. parvum, 31,4% (16/51) a C. hominis, 9,8% (5/51) a C. felis e 5,9% (3/51) a C. meleagridis. No que se refere aos criptosporídeos de hospedeiros não humanos – gado doméstico e ruminantes silváticos (gamos da Tapada Nacional de Mafra e Bovídeos do Jardim Zoológico de Lisboa), estudados retrospectivamente, e gatos e animais do Jardim Zoológico, estudados prospectivamente –, nos casos em que a amplificação do DNA foi bem sucedida, os resultados da sua caracterização molecular mostraram que: i) 94% (80/85) dos isolados bovinos e todos os isolados de ovinos (n = 2), de gamos da Tapada de Mafra (n = 4) e de Bovídeos do Jardim Zoológico (n = 11) pertenciam à espécie C. parvum; ii) 2,4% (2/85) dos isolados bovinos pertenciam à espécie C. bovis; iii) 2,4% (2/85) dos isolados bovinos pertenciam à espécie C. andersoni; iv) 1,2% (1/85) dos isolados bovinos pertenciam ao genótipo semelhante ao do gamo; v) os isolados detectados nos dois gatos pertenciam à espécie C. felis; vi) os parasitas encontrados nas fezes do bisonte americano, do gnu de cauda branca e da tartaruga estrela indiana pertenciam, respectivamente, ao genótipo rato, a um genótipo novo e ao genótipo tartaruga. Entre as espécies e genótipos identificados nos isolados animais, duas – C. parvum e C. felis – foram, também, encontradas em infecções humanas, facto que nos leva a considerar os seus respectivos hospedeiros – gado doméstico, ruminantes silváticos e gatos – como possíveis reservatórios zoonóticos da infecção humana. A determinação da diversidade intra-específica de C. hominis e de C. parvum foi realizada por caracterização molecular de um locus de microssatélites – ML2 – e do gene GP60. A análise de fragmentos por metodologia fluorescente do STR ML2, revelou a ausência de variabilidade genética em C. hominis e permitiu caracterizar, somente, 47% (8/17) dos isolados de C. parvum humanos estudados; a presença de múltiplos picos nos electroforetogramas dos restantes parasitas de origem humana e nos de todos os outros animais impediu a identificação dos seus alelos. Os dois alelos identificados nos oito isolados de C. parvum humanos – ML2-176 e ML2-191 – não foram encontrados em nenhum dos parasitas de gado doméstico ou de ruminantes silváticos. Em virtude da impossibilidade de identificar o alelo de todos os parasitas da espécie C. parvum em estudo, a caracterização do locus ML2 mostrou ser de pouca utilidade para o nosso trabalho. A caracterização do gene GP60, permitiu identificar nove famílias de subtipos, quatro em C. parvum e cinco em C. hominis. Entre os parasitas da espécie C. parvum, os de origem humana apresentaram maior variabilidade de subtipos do que os de gado bovino e de ruminantes silváticos. A maioria dos isolados de gado bovino (61/72), um de gado ovino, um de gamos da Tapada de Mafra e todos os dos Bovídeos do Jardim Zoológico (n = 9) apresentaram o mesmo subtipo – IIaA15G2R1 –, o qual foi, também, encontrado em nove isolados humanos. O segundo subtipo de C. parvum mais frequente em isolados bovinos – IIaA16G2R1 – não foi encontrado em isolados humanos. Os dois subtipos menos frequentes em gado bovino e ovino – IIdA17G1 e IIdA21G1 – foram, também, identificados em isolados humanos. Em alguns parasitas humanos de C. parvum foram, ainda, encontrados quatro subtipos, pertencentes a três famílias, não identificados nos isolados de gado doméstico ou de ruminantes silváticos – IIbA14, IIcA5G3, IIdA19G1 e IIdA22G1. O facto de, em Portugal, isolados de C. parvum com o mesmo subtipo terem sido encontrados em infecções, não só humanas, como, também, de gado doméstico e de ruminantes silváticos indica que a sua transmissão ao Homem pode ocorrer pela via zoonótica e, também, pela antroponótica. Ainda, a identificação, em isolados de C. parvum humanos, de famílias/subtipos não encontrados nos animais, coloca a hipótese destes parasitas serem transmitidos ao Homem, unicamente, pela via antroponótica. Em suma, os resultados obtidos no presente trabalho sugerem que, em Portugal, a transmissão de C. parvum ao Homem envolve dois grupos de parasitas, um constituído por aqueles que são transmitidos, quer pela via zoonótica, quer pela antroponótica e, outro, composto pelos que são veiculados, exclusivamente, pela via antroponótica.