Summary: | A pesquisa identifica mecanismos de construção de memória da técnica no grupo barragista. Este grupo, que fez parte da multidão de trabalhadores que construíram barragens em Portugal, construiu identidade no trânsito de uma obra para outra: o estaleiro foi o território onde se reconfiguraram crenças e costumes. As dinâmicas observadas, semelhantes a outras movimentações de trabalhadores em obras de grande escala, articulam-se com os processos laborais globais. Os trabalhadores migrantes constroem as suas referências identitárias no trânsito, cruzando dimensões transnacionais, nacionais, regionais e locais, conforme estudado pelo antropólogo brasileiro Gustavo Lins Ribeiro (construção de Brasília e da barragem binacional de Yacyretá). Os processos de construção de memória barragista estruturaram-se em livros, encontros e comemorações: o bairro do Barrocal do Douro, construído propositadamente para apoio ao aproveitamento hidroelétrico de Picote é um importante locus de memória. O estudo do grupo barragista foi também ocasião para identificação de movimentos cívicos a propósito do uso dos recursos hídricos. Se, nos anos 1950, a construção de barragens se enquadrava no combate pela industrialização do país, nos anos 1990 o movimento cívico criado a partir da descoberta arte rupestre, da região do rio Côa, foi ocasião de maior participação neste debate, reivindicando agora os valores da cultura contra o “império do betão”. O conflito entre aquilo que deve ser lembrado e o que deve ser esquecido adquiriu novas significações. A conclusão retoma os três derivados identitários: barragistas, protagonistas da construção política da paisagem tecnológica e ativistas em defesa do património arqueológico do vale do rio Côa.
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