Resumo: | O presente trabalho tem por objetivo contribuir para a definição das práticas funerárias do 4º e 3º milénios a.n.e. no Maciço Calcário Estremenho, numa leitura realizada a partir da Lapa da Galinha, que constitui o caso de estudo. Esta cavidade cársica, intervencionada em 1908 por colaboradores do atual Museu Nacional de Arqueologia, onde se encontra em depósito a coleção arqueológica analisada, foi utilizada como espaço funerário durante o Neolítico e Calcolítico, constituindo um exemplo paradigmático do designado “Megalitismo de gruta” que caracteriza o âmbito geo-cultural em que está inserida. O abundante espólio votivo recolhido foi sumariamente apresentado em meados do século passado, correspondendo a cerca de 900 registos associados a um número mínimo 70 inumações, refletindo o evidente caráter coletivo das deposições funerárias realizadas no interior desta gruta-necrópole. Foi executado um estudo tecno-tipológico e das matérias-primas das várias categorias artefactuais identificadas, que, por sua vez, possibilitou a consolidação de uma proposta de utilização crono-cultural do sepulcro, balizada entre a segunda metade do 4º e o primeiro quartel do 3º milénio a.n.e. Ainda que a ausência de um contexto arqueológico bem definido seja incontornável, o estabelecimento de paralelos regionais e extra-regionais, fechados e bem compreendidos, providenciou um elevado grau de solidez ao modelo proposto, igualmente corroborado pela homogeneidade acentuada do conjunto votivo. A análise à escala micro da paisagem funerária que integra a Lapa da Galinha revelou-se um exercício fundamental para compreender a evolução das práticas e gestos funerários das comunidades neo-calcolíticas neste setor do Maciço Calcário, sendo, contudo, passível de ser aplicada a toda esta unidade geomorfológica. A riqueza interpretativa disponibilizada pelas diversas grutas naturais utilizadas como contentores funerários, que dominam o inventário dos sepulcros da região, constitui um fator determinante para a sua valorização no contexto do fenómeno megalítico, mas também dos subsistemas simbólicos que caracterizam o Sudoeste Peninsular. Nesse sentido, assume particular importância o destaque de determinados elementos votivos, cuja matéria-prima, mas principalmente a ideologia subjacente ao mobiliário votivo, indica a integração desta área geográfica nas redes de circulação e intercâmbio do 4º e 3º milénios a.n.e. Assim, e a partir da revitalização de dados antigos, pretendeu-se consagrar uma nova perspetiva sobre um território de potencial inequívoco.
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