Summary: | A análise histórica dos primeiros anos da dinastia lágida (objectivamente os reinados dos três primeiros Ptolomeus: Ptolomeu I Sóter, Ptolomeu II Filadelfo e Ptolomeu III Evérgeta I) deve considerar uma vertente subliminar mas activa da sua actuação em prol da definição e operação de um conjunto de estratégias voltadas para aquilo que podemos chamar «a refundação da monarquia e do Estado». Essas estratégias, tomadas como um todo e entendidas como acções intencionais de propaganda e de ideologia, denotam, cada uma de sua forma, a atenção do poder real lágida pelas particularidades culturais dos seus súbditos e a natureza mais profunda desse poder no sentido de promover e alcançar uma verdadeira refundação do Estado egípcio, adaptado ao novo contexto (cosmopolita, urbano e monetário) e aos novos desafios e às novas exigências que colocava (aceitação e legitimação dinástica, justaposição sócio-demográfica e coexistência político-cultural das populações). A Aegyptiaca ou História do Egipto de Maneton, redigida em grego, cerca de 280 a.C., no reinado de Ptolomeu II Filadelfo, constitui neste particular um documento fundamental sobre a vida política, social e religiosa dos antigos Egípcios e um instrumento vital nessa acção estratégica de redefinição e refundação do Estado egípcio. No sentido de isolarmos cabalmente as perspectivas múltiplas e cruzadas que convergem e que emergem desta obra, parece-nos essencial considerar as suas condições de produção, transmissão e recepção. A «arqueologia» da produção permitir-nos-á clarificar os principais objectivos da redacção manetoniana e, a partir daí, compreender os mecanismos propagandístico-ideológicos que ela serviu e utilizou.
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