Resumo: | A transição de uma modernidade sólida, pouco flexível, para a modernidade líquida e fluida, que Sygmunt Bauman (2000) descreveu no início do século XXI, teve, e continua a ter, desafios consideráveis. Por isso, a questão da autonomia se revela tão pertinente no sentido de preparar não apenas os alunos, mas também os educadores, os professores e as escolas para esta nova realidade permeada pela globalização e tecnologia. Consequentemente, aptidões como raciocínio, resolução de problemas, pensamento crítico e criativo, relacionamento interpessoal, autonomia e desenvolvimento pessoal são algumas das competências chave consagradas no documento Perfil dos alunos à saída da escolaridade obrigatória (Martins et al., 2017) e fomentadas pela União Europeia. Educar e formar para a autonomia é, provavelmente, o maior desafio educacional que as escolas, os educadores, os professores, as famílias e a comunidade enfrentam na atualidade. Deve configurar mais do que um objetivo, constituindo-se antes como um compromisso das instituições educativas, de todos os educadores e professores desde que uma criança entra no sistema educativo e prosseguindo ao longo de toda a sua vida. Isto significa que todos, pais, educadores e professores, gestores e responsáveis pela formação, devem assumir esse compromisso, procurando criar as melhores condições para que a criança, o jovem e o jovem adulto possam desenvolver a vontade, as capacidades, os conhecimentos, mas, sobretudo, a sua agência participativa para ser, estar e tornar-se em realidades sociais tão líquidas, voláteis, incertas e complexas como aquelas que vivemos na atualidade e as que se perspetivam para o futuro. O conhecimento, como bem refere Paulo Freire (1996), é um processo criador que emerge através da invenção e reinvenção do questionamento inquieto e impaciente, mas esperançoso. O conhecimento não se reduz a uma mera transferibilidade de saberes, mas aspira à transformação das crianças e dos adultos, porque transforma tanto o que se conhece como o conhecedor. Torna-se, por isso, necessário reconhecer as interdependências entre crianças e adultos e os desafios que essa aceção representa pois, para que o contexto onde se desenvolve a ação potencie a autonomia, tem que se constituir como um espaço de liberdade. Um espaço que aceite a participação de todos, que favoreça o diálogo, a negociação e a escuta, mas também que estimule a ação reflexiva e a construção do pensamento crítico dos profissionais para agirem com intencionalidade ética. Um espaço que agencie todos os atores é um espaço social de conhecimento pela interação, pelo respeito ao serviço da autonomia de cada um. Nesta perspetiva, que assume que a autonomia de quem é educado e a autonomia de quem educa são dimensões que se interpenetram no processo educativo, então poderemos considerá-lo como fator-chave da qualidade em educação. Como menciona José Contreras Domingo (2001), a autonomia docente como qualidade do processo educativo consiste na consciência sobre a docência, sobre o fazer e sobre o ser educador e professor, mas, também, sobre o sentido do ensino e da educação na sociedade. Os saberes pertinentes a docência, de acordo com o investigador, não permitem separar “elaboração e aplicação” ou “teoria e prática”, a ação crítica dos educadores e professores e a assunção do compromisso com a comunidade. Antes induz à sua reunião e revelação diretamente no contexto humano e social em que o fenómeno educativo acontece. Entendemos, por isso, que a autonomia em educação se expressa a partir dos conceitos de responsabilidade, confiança, aprendizagem ao longo da vida e, sobretudo, de poder: poder para incluir, estando atento a diferença cultural e a diferença do “outro”; poder para valorizar o saber de uma forma coerente e flexível; poder para desenvolver competências digitais e linguísticas; poder para continuar a promover valores humanistas que, felizmente, continuam a definir a nossa cultura.
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