Summary: | A administração oral de Lactococcus lactis produtor de Hsp65 tem se mostrado, em trabalhos anteriores do nosso grupo, uma estratégia muito eficaz na prevenção de modelos experimentais de doenças inflamatórias crônicas como a colite ulcerativa e a encefalomielite autoimune experimental (EAE). Esse tratamento foi capaz de induzir tolerância oral à proteína de choque térmico Hsp65, geralmente expressa em tecidos inflamados, gerando células T reguladoras no intestino que interferem na patogênese dessas doenças. Verificamos, neste estudo, que o tratamento oral com Lactococcus lactis produtor de Hsp65 levou a uma expansão de células T reguladoras CD4+Foxp3+ e CD4+LAP+ de maneira dependente do receptor do tipo toll-2 (TLR2). Também observamos que os efeitos imunorreguladores do L.lactis-Hsp65 ocorreram sem prejuízo à imunidade anti-infecciosa em camundongos C57BL/6. Camundongos tratados com L.lactis-Hsp65 conseguiram manter a resposta imune anti-infecciosa na infecção por Salmonella thyphimurim. Além disto, ocorreu uma melhora da inflamação intestinal associada a essa infecção sugerindo que o tratamento com o L.lactis- Hsp65 potencializou os mecanismos imunorreguladores presentes na mucosa intestinal. Observamos que células T gd, principalmente nas placas Peyer, expressam TGF-b de superfície (associado ao peptídeo LAP), o que pode se constituir em outro importante mecanismo de regulação na mucosa intestinal. Embora o tratamento com L.lactis-Hsp65 tenha sido bem sucedido nos modelos experimentais de colite e EAE, ele não teve efeito benéfico no desenvolvimento da diabetes espontânea em camundongos NOD mesmo quando associado ao L. lactis produtor de IL-10. Nossa hipótese para explicar essa falha foi que a suscetibilidade à diabetes tipo 1 nesses animais envolve defeitos não somente na geração de células T reguladoras autorreativas na timo, mas também alterações importantes nos elementos imunorreguladores da mucosa intestinal. De fato, observamos que não foi possível induzir tolerância oral a ovalbumina em camundongos NOD utilizando a ingestão contínua de antígeno, regime ótimo de indução de tolerância pela via oral. Além disto, demonstramos que o desenvolvimento da patogênese da diabetes nesses animais está associado a uma redução de fatores de regulação da mucosa e desequilíbrio entre células T efetoras e reguladoras no intestino, com resposta Th17 aumentada e predominância de células apresentadoras de antígeno com perfil inflamatório. Já é amplamente reconhecido que tolerância em nível sistêmico pode ser alcançada pela exposição de antígenos pela mucosa, significando que a atividade imunológica no intestino pode afetar o funcionamento global do sistema imune, mesmo em órgãos não diretamente relacionados. Se o pâncreas e o intestino são imunologicamente conectados através dos linfonodos pancreáticos, não causa espanto que a perda ou redução de fatores de regulação na mucosa possam contribuir para os eventos patogênicos da diabetes autoimune. Entender os fatores e mecanismos que contribuem para o funcionamento das atividades imunológicas no intestino assim como as perturbações nessas atividades é importante para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas via mucosa que sejam seguras e bem sucedidas.
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